segunda-feira, 16 de março de 2015

Uiara

Ao cair os tons alaranjados de todas as tardes a Mãe D’água surge de dentro das águas, suntuosa. Seus cabelos negros e longos laçam-se às flores silvestres da mata. Todo mês de Maio ela aparece quando o sol toca as águas. Dizem ser possível ouvir o fervilhar delas anunciando a chegada da morena de olhos negros como a noite. À medida que canta mais inquietos ficam os homens pelo não sei o quê.
Houve um dia, um potiguara sonhador e audacioso estava pescando e perdeu-se no tempo dos pensamentos sem perceber que o dia findava e as águas adormeciam e se calavam. Acho que estou variando, imaginou. Uma mulher de olhos grandes e faiscantes erguera-se de dentro do rio. O potiguara teve medo, mas não adiantava recuar se o feitiço da Mãe D’água já o enlaçara por completo. Ele sofria de saudade e ela crente de seu encanto, esperava. Olharam-se por segundos. Ele sorriu.
Neste mês das flores silvestres o índio invadiu de canoa no rio. Seu corpo trêmulo padecia de um abraço. Ela veio vindo, vagarosamente. Abriu os lábios úmidos e dissipou seu canto suave. Houve festa nas profundezas do rio Potengi. E dizem os mais velhos – eu não sei – que todos os dias quando o céu se cobre de vermelho, aparece uma morena toda enfeitada com rosas de jerimum caboclo e de longos cabelos negros que flutuavam na correnteza do rio a esperar pelo seu noivo porque um só não bastara.

Tibúrcio Valério

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