terça-feira, 4 de junho de 2013

Melissa

Pela primeira vez experimentara o sabor de uma frustração amorosa. Pelo menos dizia ser. Há gente que diz ser loucura de sua cabeça, na verdade, todos diziam que era loucura. O fato é que agora, encontrava-se no viaduto em frente ao shopping, aos prantos, dizendo querer cometer suicídio. Tudo porque, segundo ele, fora abandonado por Melissa. Esse era o nome da infame. Mulher magra, bonita, alta. Bem verdade que sua pele era pálida, mas, todavia sempre estava bem vestida. Conheceram-se naquele mesmo shopping. “Me lembro como se fosse hoje... logo que a vi me encantei. Ela usava um vestido de renda que cobria seu corpo quase que por inteiro, embora deixasse sua silhueta bem desenhada. Como era linda ela.”, dizia o homem durante um acesso de choro.
Em pouco tempo os arredores do shopping parecia dias de protesto contra Micarla, milhares de pessoas esperando ele pular e outras tentando acalmá-lo, tudo numa tentativa falha, já que o barulho de tantas vozes deixava-o mais tenso.
“Foi naquele Natal que nos apaixonamos e começamos a nos encontrar toda semana aos domingos. A cada encontro ela estava mais linda”, seu choro era inconformado, parecia criança quando lhe roubam o doce. Em meio a toda essa confusão, foram acionados os bombeiros, polícia, médicos, inclusive sua mãe. Todos tinham a mesma intensão: fazer com que aquele homem desistisse do que pretendia. Dizia não aguentar viver sem ela, preferia morrer a permanecer sozinho no mundo sem a mulher da sua vida.
A mãe ficara atônita com a atitude do filho. Dizia não conhecer a “dita cuja”, apenas o que sabia era que o filho estava vivendo um relacionamento e pretendia apresenta-las uma a outra, porém esse dia nunca chegava.
“Estávamos felizes. Ela me amava, eu sei. Se vestia sempre impecável para me encontrar aos domingos, mas ontem quando trouxe flores senti que ela estava estranha. Nunca tínhamos discutido, nem nada! E quando chego na loja hoje ela tem desaparecido sem sequer ter me falado” contava o homem entre choros e soluços. Aquele comentário provocou um murmurinho entre os funcionários do shopping que estavam por perto. Quem seria a mulher que estava prestes a matar uma pessoa mesmo que indiretamente? Todos começavam a se questionar e em pouco tempo a história já havia se espalhado pelos corredores daquele lugar.
Não havia conversa que desse jeito ao homem desesperado, que agora estava praticamente pendurado nas grades da passarela. A única solução parecia ser descobrir quem era Melissa. Alguns bombeiros já haviam saído em busca dessa tal mulher entre lojas e corredores do shopping. Tudo em vão! Entraram em contato com a segurança daquele centro comercial no intuito de pesquisar imagens do homem e tentar descobrir sobre a mulher misteriosa, talvez, assim, a encontrariam e, quem sabe, Melissa poderia evitar um desastre de um amor mal resolvido. Mas as imagens era sempre as mesmas, o homem sempre perto da vitrine, admirando, outras vezes gesticulando, parecia conversar com o seu reflexo no vidro.
Caminhando certa vez pelo shopping, Cláudio depara-se com aquele manequim bem vestido, arrumado. Foi amor à primeira vista. Não sabia explicar, mas era mais forte que ele. Por horas ficava em frente à vitrine olhando apaixonadamente para aquele objeto em formato de um corpo feminino, até conversava com ela. Dizia ser correspondido, tanto que a moça havia falado seu nome, Melissa. Tinha quem dissesse achar que se tratava de um ladrão que todos os domingos ia estudar o movimento da loja. Mas a verdade é que era apenas um homem apaixonado, diferente, era verdade. Inusitado, talvez, mas a mais pura verdade.
Quando finalmente os bombeiros entenderam do que se tratava aquela loucura, tentaram argumentar com Cláudio sobre o que estava acontecendo, que aquilo era ilusão de sua cabeça, que Melissa, na verdade, se tratava de um manequim e que ele jamais poderia ter um envolvimento com ela. Mas, ele era irredutível, afirmava categoricamente que ela era uma mulher e eles tinham um relacionamento, ou pelo menos tiveram, e tinham planos de uma vida juntos. “Ela todos os domingos usava uma roupa nova pra a gente se ver”. Ele não sabia que todos os domingos antes do shopping abrir, o responsável pelo visual da loja trocava todas as roupas das manequins, por isso sua Melissa sempre estava bem vestida.
Por fim, trouxeram o manequim àquela confusão, mas parecia que o fato de ele agora já saber que Melissa era apenas um objeto decorativo o fez despertar algo dentro de si, mesmo que inconscientemente, e ao ver aquela boneca com todos os traços de sua amada, sentiu um repúdio e a negou. “Essa não é a minha princesa! Ela partiu porque nunca me quis de verdade e ela não é essa aí que vocês estão me mostrando” berrava aos prantos Cláudio. Depois de horas de conversa, pedidos, choros de sua mãe ele foi acalmando-se até deixar que os bombeiros se aproximassem dele e tirá-lo de lá. De encontro com os braços de sua mãe, o homem chorou por vários minutos como um bebê que sente fome. Sua fome era de amor. Voltou pra casa e tudo se acalmou, as pessoas se dispersaram e logo esqueceriam o acontecimento.

Cláudio nunca superou a perda da Melissa, mesmo que a manequim jamais tenha saído daquela vitrine a não ser para resgatá-lo da morte. E até hoje ele é visto pelo shopping ao redor da vitrine observando a boneca. Talvez pensasse que um dia sua Melissa voltasse, porém sabia, ou não queria saber que ela de fato nunca existiu como mulher para fazê-lo feliz.

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